Project Creation: Entrevista a Hugo Flores

por Paulo Trindade

Depois da boa aceitação de “Floating World”, os “Project Creation” voltaram a surpreender com o registo “Dawn on Pyther”.

Hugo Flores, mentor do projecto, concedeu uma interessante entrevista à Lusitania de Peso onde estabelece um balanço do seu trabalho e nos revela detalhes dos seus outros projectos.

1 – Como é tradição na Lusitania de Peso, atendendo ser a primeira entrevista de Project Creation ao nosso site. Como começou a história de Project Creation (PC) e como tem sido o seu percurso até à data actual?

PC surge quando eu estava a finalizar as gravações do álbum Out of Place dos Sonic Pulsar. Na altura tinha um conjunto de músicas mais electrónicas as quais não sabia bem onde encaixar, pois não era totalmente o género de Sonic Assim, comecei a trabalhar nas ideias de base e as musicas já estavam a assumir uma dimensão épica que saía do espectro de Sonic. Queria também trabalhar com mais músicos e assim nasce o 1º álbum Floating World com uma história de ficção sobre uma nave gigante e a colonização e renascimento de um planeta através dos poderes dos entes do mundo Flutuante.

O conceito e a história pretendem abordar duas vertentes. Uma delas é deixar bem patente que todos nós podemos ser criadores de outros seres, sendo que o tema da vida e da morte é debatido constantemente. Fazendo uma retrospectiva e tendo também em consideração o meu novo Projecto Factory of Dreams, penso que a escuridão e a luz, o positivo e o negativo são temas que abordo recorrentemente talvez por ser uma das coisas fulcrais em que penso com frequência.

No Mundo de Project Creation a liberdade é também um tema fulcral. Todos fazem o que querem e aquilo para o qual estão vocacionados. Não devem haver ideias preconcebidas, cada um deve tentar responder por si próprio às questões principais. Mesmo o sonho mais impossível, o da libelinha mecânica tornar-se humana, vai ser uma realidade no 3ª álbum.

A segunda vertente de PC é o de simplesmente explorar um universo de ficção e elaborar uma história grandiosa, dividida em 4 álbuns pelo menos.

1.1 – Atendendo que o teu antigo projecto Sonic Pulsar estar inactivo, não será justo considerar que PC veio ocupar lugar deste teu anterior projecto?

Ainda não decidi se Sonic vai ter ou não continuação. Project Creation e Factory são as minhas prioridades agora e Sonic terá de ficar para trás, apesar de o conceito e algumas composições e letras para o 3ª Pulsar estarem definidas. Mas talvez venha a incorporar tais ideias num Project Creation futuro, após terminar este enredo que tenho de momento. Se tal acontecer, sim, é justo considerar o que referes.

2 – Ao ouvir “Dawn on Pyther” depois de “Floating World” é notória uma evolução a diversos níveis. Sentiste essa necessidade de procurar fazer algo ainda mais arrojado que o primeiro registo?

Sim, sem dúvida. Para o bem ou para o mal, agradando ou não a novos ou antigos fãs, quis deliberadamente fazer algo mais trabalhado e mais complexo. Sei que o álbum tem tido criticas muito boas, mas é um álbum arriscado… repara que a maioria das faixas tem perto dos 8 ou 9 minutos. Mas dentro de cada faixa há sempre muito para que o ouvinte possa desfrutar ao máximo da música e historia, se estiver para aí virado claro. Dawn on Pyther beneficiou de uma aprendizagem bastante grande com o 1º cd. Para o Dawn, comecei com alguma ideias, que surgiram maioritariamente através de simples melodias no synth e depois aliei essas melodias a ideias para a história e o álbum vai-se construindo e encaixando-se no enredo.

Só para dizer ainda que, apesar de maior complexidade deliberada, as composições de base foram muito espontâneas, mas o desenrolar foi uma busca constante por ter algo de melodioso, variado e por vezes complexo, mantendo sempre a marca de PC, partes muito ambientais contrastadas com um lado mais caótico. Vivemos num Mundo e Universo feitos de extremos e PC pretende representar isso mesmo.

2.1 – Estes dois trabalhos são parte integrante de uma trilogia, certo? Como surgiu essa ideia? Podes nos descrever um pouco a historia dessa trilogia?

Não me recordo bem, a historia é muito extensa [risos] …. Agora a sério, sei que tinha uma história de ficção para contar e muitas ideias para serem reflectidas num álbum apenas. Daí surge a ideia de uma trilogia. Acontece que afinal vai haver afinal mais álbuns do que pensava. Teremos pelo menos 4 álbuns.

Quanto ao seguimento da história, Dawn On Pyther começa onde Floating termina. Para o terceiro, vou cortar um pouco mais com os detalhes da história e não me vou preocupar tanto com o que bate certo ou não de um álbum para o outro… a entidade mecânica, a libelinha, vai descobrir um novo Mundo e isto será o ponto de partida para falar sobre algumas ideias e conceitos que tenho sobre o universo, possíveis dimensões, etc…

Descrever a história? Bem, tudo começa com o Floating World que por si só é uma entidade quase viva. È um mundo com várias gerações a crescer nele. Podem vê-lo em movimento no nosso videoclip no myspace ou site oficial.

O Floating World encontra um planeta morto, transmite-lhe energia e coloniza-o. A pirâmide Cheops é construída como símbolo do renascimento do planeta.

O Dawn on Pyther já desenvolve mais a história de Cheops e mostra a sua evolução (torna-se uma entidade viva) e detalha a comunicação entre Cheops e as chamadas libelinhas mecânicas. No final, uma das libelinhas parte para o espaço à procura de um Mundo que Cheops lhe mostrou nos sonhos.

3 – Tiveste a trabalhar contigo uma vasta equipa, podes apresentar de forma sucinta o pessoal que trabalhou contigo em “Dawn on Pyther”?

O Linx foi o elemento em que pensei de imediato desde o 1º registo. Um timbre de voz que aprecio imenso e que encaixa no estilo da musica muito bem. O Linx contribuiu com algumas ideais para os álbuns e “apanhou” imediatamente o que era pretendido.
Paulo Chagas, grande saxofonista e flautista. É um grande músico. Desta vez não apenas gravou grandes melodias e solos de sax e flauta, como gravou e compôs a ultima parte da Voyage of the Dragonfly.

Alda Reis tem uma óptima voz suave e lírica, Ptrocker contribuiu com os seus frenéticos solos de guitarra, entre outros.

No novo álbum encontramos a Zara Quiroga, que me surpreendeu com uma voz extremamente versátil! O Dawn on Pyther também conta com bons solos de synth do Shawn Gordon da Progrock Records e com o Davis Raborn na bateria.

Uma palavra também para o Paulo Pacheco que muito bem soube agarrar os temas e pode-se ver pelos Forgotten Suns actuais, tem uma óptima voz para Prog Metal, forte e colocada.

O Fred Lessing também colaborou e teve a ideia espectacular para o início da Flying Thoughts (faixa 2). Estou a colaborar com ele no seu próximo álbum, onde participo com algumas vozes.

4 – Como se desenrolou o processo criativo de “Dawn on Pyther”?

Primeiro de tudo comecei a trabalhar nas letras e para isso segui o guião da história. As letras tinham de reflectir os temas e como que narrar a história. Os gráficos tinham de estar colados a cada faixa, para que quem comprasse o álbum conseguisse seguir a história através da artwork e ao mesmo tempo ir ouvindo a musica.

Mas tudo tem de ser melhorado e esse processo demora tempo e muita assimilação do som que se tem e das ideias que podem ou não funcionar.

Tinha letras e músicas, e uma das tarefas era definir em que música deveria uma letra encaixar ou vice-versa. Por vezes tal não funciona e tem de se reescrever partes da música ou da letra para ir ao encontro da ambiência ou emotividade de uma das partes.

As gravações começaram pela base em sintetizadores, depois seguiram as guitarras e depois o baixo. As baterias foram gravadas no synth, e depois as necessárias foram enviadas para o Davis que gravou no seu estúdio a bateria acústica.

Passei bons momentos a definir também as vozes e onde estas deveriam aparecer. As melodias vocais tiveram um processo interessante, porque apesar de ter definido algumas destas melodias, algumas das melhores surgiram mais de improviso com cada um dos vocalistas, no momento da gravação.

5 – Como têm sido as reacções ao “Dawn on Pyther”? A ideia que eu tenho é que o trabalho tem sido muito bem recebido pela critica especializada…

É verdade. Tanto quem compra o álbum como os críticos têm apreciado o álbum e a projecção é assinalável devido à parceira da Progrock records com a SPV. O álbum teve mais projecção que o primeiro e tem também tido mais oportunidades em revistas de grande escala como a Thisisrock na Espanha e a Scifi Magazine na Holanda e Bélgica.

Alguns críticos preferiram o Floating World ao Dawn, encontrei alguns casos destes que preferem mais o rock progressivo ao rock mais hard progressivo do Dawn, mas no geral todos concordam que este é um pouco superior ao nível do som e complexidade.

6 – A ideia que tenho é que Project Creation é bem mais reconhecido no exterior do que em Portugal. Comungas desta opinião? Que razões pensas que possam estar na base deste desfasamento?

Concordo, mas isso também acontece devido a uma possível menor aposta em Portugal, talvez porque a promotora/editora sabe que não terá grande feedback. A meu ver, parece-me que o público português está um pouco direccionado apenas para o que lhes é oferecido. Lá fora poderá também ser assim, mas existe uma diferença que é a existência de um mercado para a música progressiva e mais trabalhada, além de que as pessoas estão mais receptivas a apreciar outros géneros. Aqui dizem que gostam, mas depois ninguém compra ou desinteressa-se.

Project Creation tem boa visibilidade no estrangeiro. Atingimos um público maior e o álbum aparece em revistas, sites, rádios, apesar de ser sempre difícil chegar aos canais ditos mainstream.

7 – Já existem algumas ideias para o próximo registo dos PC? Queres partilhar algumas?

Sim, apesar de até Maio/Junho estar muito dedicado ao Factory of Dreams e o Dawn também ter acabou de sair, mas sim tenho já cerca de 80% das ideias bem definidas e sempre que tenho tempo, dedico-me ao futuro PC. De um modo resumido, o 1º álbum mostrou o Mundo Flutuante e a colonização do planeta Pyther, bem como a apresentação dos robots mecânicos que querem tornar-se humanos.

No segundo álbum, o Dawn, a pirâmide Cheops ganha vida e comunica à libelinha mecânica coordenadas e imagens de um planeta que ela deve descobrir.

O futuro 3º álbum vai ser todo vocacionado para a descoberta de um local no espaço, um novo planeta, que esconde segredos como uma cidade feita de vidro e gelo, um oceano vivo e inteligente, entre outras coisas. Na realidade não quero que o 3º esteja tão agarrado à historia de base, quero sobretudo apresentar ideias e cenários de ficção, como que cada música fosse um episódio de novas descobertas.

8 – Tu continuas envolvido em diversos projectos para além de PC. Nomeadamente o projecto Dimension e a tua colaboração com Fred Lessing. Podes nos falar sobre estes projectos?

Dimensions deveria ser o próximo trabalho em que me iria debruçar…tal lugar foi tomado pelo Factory of Dreams. Dimensions é metal melódico puro e terá poucas teclas senão nenhumas. Espero poder trabalhar nesse projecto daqui a pouco tempo, mas se não peguei nele já é porque talvez não o ache tão natural para mim. Vejo um pouco as coisas deste prisma. O que me interessa agarro com força e não descanso até não ter o trabalho final.

O Fred Lessing para além de ter participado no Dawn, tem um projecto a solo para o qual tive o prazer de gravar voz. O álbum poderá sair ainda este ano.

Outros projectos, bem, recentemente gravei com o Davis Raborn, Carlos Mateus e um baixista Canadiano, o Mark Guertin, uma cover de uma música do Carlos Santana. É um tributo que vai sair pela Mellow Records em breve.

8.1 – Continuando a lógica da questão anterior, recentemente viste-te envolvido num projecto com Jessica Lehto, Factory of Dreams. Como surgiu este projecto? Factory of Dreams explora aspectos musicais bem diferentes de PC. Podes descrever musicalmente Factory of Dreams?

Factory surge pela necessidade em fazer algo de mais simples e acessível. Apesar de gostar de coisas mais elaboradas, por vezes também reconheço que preciso de ouvir algo mais acessível e agradável. Produzir um álbum como Dawn on Pyther foi algo desgastante e senti que devia arranjar um escape a esse Mundo de PC.

As 11 musicas que compõem Factory foram feitas muito rapidamente e depois fui melhorando-as.

De qualquer forma, Factory apesar de ser um Rock muito Ambiental e Gótico-electrónico vai ter alguns elementos progressivos aos quais eu simplesmente não me consigo afastar.

O álbum vai chamar-se The Poles e fala sobre um Mundo dividido em dois, a parte positiva e a negativa, fala sobre uma máquina que todos estranham e querem destruir, fala sobre uma fábrica de ilusões, fala sobre a viagem de uma pessoa que pretende passar do pólo negativo para o positivo, entre outras coisas. Até hoje nada foi tão espontâneo como a musica e letras do Factory.

Quanto à voz, queria uma vocalista… apenas uma, para sair do esquema de vários vocalistas de PC. Fiz algumas audições, e finalmente a Jessica Lehto foi uma escolha natural. O single Sight of a Better Universe já está no nosso site hugofloresmusic.com e myspace.com/projectcreation

pc.jpg

9 – A cena progressiva internacional (rock ou metal), após uma fase de menor fulgor, parece ter retomado novo folgo nos últimos anos. Contudo apesar da grande quantidade de novos projectos, muitos são de uma qualidade duvidosa, limitando-se a repetir velhas formulas… Qual a tua opinião sobre este aspecto?

Sim, concordo em pleno. Muita coisa se faz, mas pouco fica no ouvido e poucos me parecem destacar-se das fórmulas pré-concebidas. A Internet e a maior acessibilidade aos métodos de gravação está a criar um mercado muito grande para os estilos progressivos o que se revela excelente para quem tem talento e quer mostrá-lo. Isto como sendo o lado positivo. Mas não se pode confundir o progressivo com ‘original e experimental mas de qualidade sonora duvidosa’.

Assim, como o lado negativo, acho que há demasiada oferta, demais para o mercado actual, e vemos muita coisa muito pouco original, e por vezes é de facto original mas a produção é simplesmente má. A produção de um álbum não necessita de ser ‘limpa’, ou seja, ser um mix refinado e limpo, mas tem necessariamente que ser mais do que razoável para ter sucesso.

Mas há sempre aquele projecto ou aquela banda que ainda me surpreendem, e ouço isso tanto nas rádios online de progressivo como em locais grandiosos como o myspace.

10 – Qual a tua opinião sobre a musica feita em Portugal? Nomeadamente, dentro do rock progressivo e do metal?

A cena Portuguesa de prog é quase inexistente infelizmente, ou existe e não é divulgada. Quando falo em prog, não me refiro somente ao rock progressivo ou metal prog, refiro-me a novas tendências, novos estilos, explorar coisas novas. Não há bandas ou projectos com projecção em número suficiente para que haja de facto um género progressivo bem patente. Também não ouço nas rádios géneros de música mais desafiantes, apesar de algumas incursões em rádios um pouco mais modestas. Há de facto poucos mas felizmente óptimos programas dedicados ao género e que passam progressivo como o programa País relativo na Rádio Universidade do Algarve, Metalmorfose, Circulo de fogo, programa FEEDBACK na rádio de Santa Maria da feira, entre outros,…

11 – Alguma questão que não te foi colocada e gostavas de responder?

Há vídeos preparados para temas deste álbum e também do anterior que já estão disponíveis nos nossos sites. Vou ver se os vídeos passam na TV, pelo menos na Sic radical e Mtv Portugal. Senão, temos sempre a Net que hoje em dia é digamos o canal privilegiado para bandas que não sejam das editoras majors.

12 – Ultimas palavras para os nossos leitores…

Quero deixar um apelo a todos os que nos lêem e que possam gostar de Project Creation e Factory of Dreams. A indústria musical está em mutação, e como devem saber as editoras e os que as rodeiam estão cada vez mais a perder potencial. Isto afecta as grandes editoras mas sobretudo as independentes, como a Progrock Records entre outras. Por isso apelo para que comprem os álbuns e não cedam ao download ilegal. Criar um álbum é duro, demora tempo e exige um investimento considerável. E um álbum não é só musica, é musica mais todo o grafismo e livro que o acompanham, já para não falar na mistura e nos anos de produção.

Existe também forma de fazer o download pago, mas a um preço bastante mais acessível que o de um cd. Veja-se o site Mindawn.com onde podem encontrar muitos álbuns, incluindo Project Creation.

Era isto que queria deixar aqui como mensagem.

Para terminar, um abraço para ti e o meu obrigado pela excelente entrevista!

Deixe um comentário